domingo, 2 de agosto de 2009

Nos ombros de menina, caía o céu como um lençol azul cheio de estrelas. E onde antes céu havia ficou um branco vazio muito branco, extremamente branco.

Maria Clara Valentin

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Te digo: é preciso que não se espere. O mundo é rude, a vida é curta. Não espere nada dos dois. Ao olhar pela janela vi o sol nascendo e senti o vento na cara, cara de menina quieta. O vento se queixou aos meus ouvidos que o silêncio branco da manhã que se erguia enchia de sono os espaços vazios. Eu sou sol, vento e sono, um grande espaço vazio. Um grande silêncio branco. Me lembro agora de uma tarde não-sei-onde não-sei-quando em que os espaços vazios e os silêncios brancos preencheram o carro e foi preciso que se abrissem as janelas. Cabeça pra fora, vento nos cabelos e pálpebras. Havia lembrança em tudo. A tarde se foi com um pedaço de mim perdido no vento, pedaço que saltou dos olhos e voou. Aos que perguntam como estou: ando vagando no vento, submersa em silêncio. Não espere.

Maria Clara Valentin

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Percebi que naquela tarde – e apenas naquela tarde – seu cabelo não ondulava daquela forma tão bonita que eu costumava observar por horas e horas numa eterna admiração muda. Também parecia mais curto que o usual, mas não ousaria perguntar se era apenas impressão de moço de vinte e três anos. Teresa continuava com aquela expressão de cansaço e tédio que se tornara um costume. Estiquei meu braço com a intenção de tocar os seus cabelos, apenas para provar para mim mesmo que Teresa era real, que seu corpo ainda era palpável. Teresa recuou com sua esquiva elegância. Naquele momento tão fatal, cada pêlo, cada osso, cada célula do corpo de Teresa me repudiava com a mesma força com que um dia me quis. Minha memória para essas coisas não é das melhores, mas creio que foi nesse momento que Teresa virou de costas e seguiu andando com sua eterna calma quase tumular. Em toda a minha vida nunca vi cena tão triste e bela. As costas de Teresa formavam uma curva que eu julgava ser castanha ou talvez azul ou talvez lavanda. E enquanto eu assistia à sua partida, o vento traidor bateu contra Teresa, trazendo até mim aquele cheiro do perfume cujo nome não me recordo, mas que até hoje está entranhado nessas malditas narinas de homem nulo. Foi então aí que Teresa virou em minha direção com aquele olhar pétreo que durante todo o tempo que estivemos juntos foi guardado com cuidado. Havia naquele simples olhar rancor e ódio necessários para que nunca me esquecesse de cada faísca de palavra que um dia saltou da minha língua para os seus ouvidos. Penso que poderia ter corrido e abraçado com todas as minhas forças o corpo frágil de Teresa de uma forma que ela nunca pudesse sair de dentro da minha boca, dos meus ouvidos, das minhas canções, dos meus pensamentos e desse ar imundo que eu finjo respirar. Poderia também não tê-la magoado, poderia ter feito tantas dessas coisas simples que as mulheres gostam de ver um homem humilhado fazendo. Mas é certo que não as fiz. Também se fizesse Teresa não se importaria. Pois a partir daquela hora incerta e oblíqua, em mim ela via nada mais que névoa se esvanecendo na brisa do amanhecer.

Maria Clara Valentin

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Num dia que passou me debrucei na janela e vi lá longe um homem só, sentado no sofá. Naquele instante me senti muito confortável e um pouco menos só na minha solidão. No natal mostraram um texto desses conhecidos e eu lembro que tinha uma parte assim: "não importa o quanto você se importe, as pessoas simplesmente não se importam". Engraçado isso vir de quem veio, muito engraçado. Mas é fato. Gritos nunca serão escutados, o fim nunca virá. Ano passado eu lembro de ter escrito em uma cadeira algo assim "toda prece é ouvida, toda graça é alcançada". Deus existe e ele é bom. As pessoas grandes são ruins e sempre serão. Essa é a lei da vida, essa é a parte triste. Todos nós nascemos para sermos corrompidos. Adeus, Peter Pan. Tantas noites eu chorei procurando por você.

Maria Clara Valentin